Oficialmente a Primavera já começou aqui, mas Gaia não obedece datas e o frio perdura, com temperatura mínima ainda em torno de 6 graus. Mas os dias já começam a ficar mais longos e já não é no escuro que vou pra academia às 6 e quinze da manhã. É bom levantar da cama e ver que o Astro-Rei também já acordou, mas confesso que estou saudosa de presentes muito especias que as frias e escuras manhãs do inverno me trouxeram. E o simples fato de estar saudosa é também pra mim um presente, pois eu vivia anunciando aos quatro ventos que não suportava frio. Melbourne me fez mudar a fala. Hoje falo: prefiro temperaturas amenas (no doubts about it!), mas consegui fazer amizade com o misterioso, introvertido e charmoso inverno.

As frias madrugadas de inverno me presentearam com céus que eram pura obra de arte. De um lado ainda escuros, salpicados de inúmeras estrelas de variados tamanhos e brilhos. Do outro lado, o mesmo onde absoluta reina a linda montanha que avistamos quando saímos de casa, já a suave claridade, prenúncio da chegada do Astro-Rei. Lembro de sair de casa e simplesmente parar extasiada frente a beleza dessa mistura de cores e luzes. E foi numa dessas memoráveis manhãs que vi a lua cheia indo dormir. Sim, ela estava já se despedindo. Enorme, amarela, quase atingindo a linha do horizonte no lado escuro do céu. Eu tenho uma especial paixão pela lua e essa imagem me fez suspirar. Um suspiro de gratidão e reverência.

Outra imagem simplesmente inesquecível foi causada pela minha mais nova amiga geada. Geada é a formação de camadas de cristais de gelo em superfícies expostas a temperaturas abaixo de zero graus. Pois bem, estava euzinha saindo de casa feliz da vida e muito bem agasalhada pra ir malhar , quando reparei que havia uma fina camada de geada cobrindo a grama e os carros. Empolgada com a primeira geada da minha vida, cheguei bem perto pra ver e tocar. Qual não foi minha grata surpresa ao ver que a camada sobre os carros apresentava padrões em formato de folhas! Simplesmente incrível! Uma obra de arte da Mãe Gaia. Fiquei ali parada por alguns minutos, feito criança, encantada com tamanha beleza. Fui pra academia num estado de enlevo, agradecendo ao Universo por ter me dado esse presente. Qual não foi a outra maior surpresa quando voltei pra casa por volta de 7 e quinze da manhã e vi que os padrões não apenas continuavam lá mas agora espalhavam milhões de micro prismas ao reluzir a luz do Astro-Rei. Juro, foi beleza demais pra mim. Eu me emocionei muito. Parei de novo ali, fiquei observando, lágrimas de felicidade brotando da alma enquanto agradecia a força divina por trás de tudo isso. Jamais esquecerei essa imagem. Entrei em casa, contei pro Diego e pedi pra ele tirar uma foto. Mas, inocentes que somos, fomos tomar café da manhã primeiro e a geada derreteu, seduzida pelo calor do sol. Depois eu fiquei pensando que talvez tenha sido melhor assim, pois acho que nem a mais potente das lentes seria capaz de captar a beleza que eu ali enxerguei. De qualquer forma, pesquisei na internet imagens de padrões de geada e achei várias imagens lindíssimas. Escolhi uma que lembra muito as formas que vi.

Outro presente que tem me encantado muito é o canto do pássaro preto. Ele embalou minhas caminhadas pra academia durante todo o inverno. Observei que ele canta preferencialmente antes do sol nascer e após o seu pôr. É um canto lindo, rico em melodias, que até ao Paul McCartney inspirou. Eu já era fascinada pelo canto do nosso pássaro preto brasileiro e estou igualmente fascinada pelo seu primo australiano, o qual apresenta um inusitado bico alaranjado. Não saberia dizer se o canto de ambos é igual, mas sei que tocam minha alma com a mesma profundidade.